O PODER DA SOLITUDE, ADOTADA CONSCIENTEMENTE

Sempre gostei de estar sozinha. Aprecio uma boa sessão de conversa com os amigos, mas no final do dia, não há nada como o rematar na própria companhia, o momento ideal para recarregar as energias. Não é de hoje que o sei. Dificilmente, conseguiria apontar para o instante exato no qual comecei a praticar a solitude, mas acredito que as razões tenham despontado no primeiro ciclo. Quando ganhei uma certa consciência de que muitas pessoas não são, de todo, nossas amigas, e abusam da nossa boa vontade para se sentirem superiores.

Longos foram os anos em que tive o pensamento formatado para renderizar a vida desta maneira, como um todo.

Daí que se tivesse de me resumir a uma só expressão, para definir o tipo de pessoa que eu era, lobo solitário adequar-se-ia na perfeição. Jamais me cansarei de enaltecer o meu secundário, que representou um dos melhores desabrochares, para mim. Foi naquela época em que estreei amizades que duram até hoje, uma época em que me permiti ao auto-descobrimento. Ser solitária, portanto, transformou-se em solitude, embora só o saiba definir como tal, presentemente.

2020 está a acontecer e escuso de enumerar a fase da qual nos estamos a despojar. Uns com mais calma, outros com uma sede incontrolável. De igual modo, não será a minha primeira, nem tão pouco, última menção do assunto. Contudo, e dadas outras circunstâncias, para mim, a solitude simboliza liberdade. Liberdade em estipular limites, ultrapassá-los e colocar a hipótese de eles nem sequer existirem. A solitude não se trata, somente, de um aproveitamento do tempo para descansarmos a alma.

Claramente, não deixa de ser uma extensão, porém, representa muito mais do que nos dizem, ou vemos por aí. Nos momentos de solitude, somos capazes de crescer. De assimilar o mundo à nossa volta e aquele que guardamos em nós. No silêncio que reverbera no nosso coração, somos capazes de escutar o nosso inconsciente, os nossos sonhos, os nossos medos. Permitimo-nos, então, a explorar o nosso centro de gravidade, expandindo-o nas atividades que nos acrescentam.

A solitude é, muitas das vezes, encarada como uma coisa má…

Ou rotulam-nos de anti-sociais, introvertidos, de poucas palavras; ou nem sequer se dão ao trabalho de experimentar compreender os motivos que nos inspiram a querer e gostar de estarmos sozinhos. É um autêntico caos, se admitirmos esta inclinação para a nossa bolha; a tendência é a de nos acusarem de depressão, quando na realidade, esta última merece mais atenção do que o entendimento raso que conjecutram dela. Amantes da solitude não são, necessariamente, pessoas depressivas. Ou ansiosas. Ou anti-sociais.

Amantes da solitude são aqueles que reconhecem em si a potencialidade de mudar as circunstâncias da sua vida, se se permitirem a interpretá-las, no espaço ao qual se dedicam, de modo consciente. A solitude é um gesto que nos abre portas; através dos seus olhos, dotar-nos-emos da capacidade de escolher sem errar em falso, e, se assim o for, pelo menos saberemos de que existe essa possibilidade. Não vou negar as minhas apreciações em relação a convivências barulhentas, à partilha de abraços e sorrisos, aos passeios da meia-noite.

Doravante, não as torno o centro da minha existência, exatamente, por estar consciente de que, ao final do dia, serei eu comigo mesma.

E isso implica, consequentemente, estar aberta à possibilidade de que haverão dias em que terei de dizer não a convites, por querer respeitar os meus anseios em querer estar sozinha. Isso implica não gerar dependências emocionais e que, por conseguinte, ao serem alimentadas, só nos magoam. Solitude é sinónimo de auto-conhecimento, e eu acredito na importância de começarmos a partilhar o lado positivo que muitos querem esconder, devido a ene fatores sociais.

Não há mal em gostarmos de estar sozinhos. Sem dúvida que não há. Uma das melhores curas passa por abrirmos o nosso coração num diálogo entre nós mesmos, sem recorrer a filtros. E aqueles que, numa eventualidade, nos privarem de conquistar esse terreno íntimo, terão de ser os primeiros a ficar ao abandono da nossa atenção. Pois, possivelmente, são os primeiros a exigir de nós o que não nos sabemos entregar, proporcionando discórdias desnecessárias.

Há limites. Há, com efeito, limites para tudo, e eu não estou para aqui a desencorajar conexões travadas com o exterior. Pelo contrário. Apenas tenho dedicado muito dos meus dias a medir os aprendizados dos últimos tempos, e um deles é aprender a aceitar este meu gosto de estar sozinha. Com uma certa lucidez e sem ter de me justificar. Já não entro em confrontos comigo mesma; aceito-me tal como sou e raramente deixo de me abraçar, seja por que razão for.

E tudo isto devo à solitude, que me guiou em direção à pessoa que, outrora, almejei conquistar. ♥

PUBLICAÇÃO INSPIRADA NO ARTIGO DO SHIFTER
“Aprendam a estar sozinhos”: o conselho de Andrei Tarkovsky para os jovens”

7 thoughts on “O PODER DA SOLITUDE, ADOTADA CONSCIENTEMENTE”

  1. Sempre tive muita tendência a preferir estar sozinha. E nem sempre isso foi (é) visto da melhor forma pelos outros. A verdade é que estar sozinho é ótimo, para nos conhecermos, para pensarmos, para descansarmos, para tanta coisa… e não impede de termos amizades boas nem de estarmos em contacto com os outros. Apenas não o fazemos sempre. Até porque a relação que mais temos de cultivar é a nossa própria companhia, porque é connosco mesmos que passamos toda a vida.

  2. Pingback: ONDE SE PLANTAM DÚVIDAS, MAS COLHE-SE PAZ | imperium blog

  3. Pingback: COISAS QUE JÁ FIZ NO MEU GAP YEAR | imperium blog

  4. Pingback: ATIVIDADES PARA PRATICAR A SOLITUDE | imperium blog

  5. Pingback: Quando é Chegado o Momento de Dizer Adeus | imperium blog

  6. Pingback: Como é que Usar Dating Apps Expandiu-me os Horizontes | imperium blog

O que pensas sobre o assunto? Gostaria de ler a tua opinião! ♥

Scroll to Top