Os últimos tempos têm-me encurralado num medo terrível em relação à vida. Nunca estive tão consciente de aspetos que, de modo corriqueiro, têm marcado a sua presença na minha cabeça, reverberando numa ansiedade que se acumula na zona do peito e da garganta, obrigando-me a acalmar a intensidade com que me coloco a cogitar no meu quotidiano. Cheguei a um patamar em que não sei ao certo o que fazer.
Não sei como é que poderei ajudar para que a mudança aconteça, pior, não sei por onde começar, pois, existem tantas possibilidades, que receio perder-me nelas. Se já me sinto desorientada por saber que elas existem, quanto mais. Não me recordo de me ter sentido assim por mais de três vezes. Tal como qualquer outra pessoa, também eu estou a aprender a lidar comigo mesma, nestas sinistras circunstâncias às quais fomos submetidos, contudo, não contava ter de apertar as mãos com este confronto tão cedo.
Estar a aprender a desconstruir mais do que planos de vida, tem sido assustador.
Não vou mentir: sinto-me borrada, só de imaginar a quantidade de camadas que precisam de ser resolvidas, não só internamente, como dentro das diferentes estruturas sociais que nos rodeiam. Dentro de um núcleo, existem extensões que, por si só, se alargam noutros parâmetros, o que contribui para o choque que, inevitavelmente, vem ao meu encontro. Questiono-me se será assim o processo de nos tornarmos adultos, mas, a pessoa que fui…
Apesar de me identificar com ela e de a enquadrar no momento em que ela existiu, atualmente, dificilmente consigo tecer raciocínios como outrora. Mudança, evolução, chamem-lhe o que quiserem. Sinto-me num limbo, incerta de como me definir. Não que seja obrigada a fazê-lo; o que me tranquiliza, na realidade, é estar consciente de que, há uns anos, também me senti assim. Não do mesmo modo, que seria de mim se estivesse a vivenciar as mesmas crises existenciais, mas dentro das inúmeras hipóteses que elas conseguem operar.
Por muito que tente, já não sei fomentar ilusões que me permitam criar projetos, no geral.
Talvez, esse método necessite de um mergulho num oceano regenerador, para pescar outro sentido. Pensar no futuro, embora com um sabor doce, dado o meu feliz otimismo e que tenho vindo a conquistar diariamente, não tem grande impacto. Estipulo objetivos, tenho planos, sei o que quero realizar e como colocar os pontos em prática, no entanto… Há uma qualquer engrenagem que me falta descobrir dentro de mim, para a colocar a funcionar em condições.
Tenho medo e não vejo porque cairia o Carmo e a Trindade, por admiti-lo. Tenho medo por mim, pelas minhas pessoas, pelo mundo em geral. Agora, explicá-lo de modo racional, e tão bem como eu saberia, numa outra circunstância, fazer? Não me sinto capaz. Não, de momento. Nas minhas mãos, abrigo uma quantidade inexplicável de características, situações, sonhos, planos, um conjunto das pessoas que fui e que preciso deixar ir, para que eu me possa libertar. Para que eu me possa afirmar. Tal como disse, não é um processo fácil.
É como querer besuntar uma enorme ferida com álcool etílico.
Compreendem o nível em que isto se encontra?
Nem tudo tem sido tão drástico. Pese embora a dificuldade em me refugiar nas atividades que me permitem recuperar as energias que se me drenam nas ocasiões de cogitação, não deixo que isso me vergue por completo. Sei, por experiências anteriores, que cristalizando as minhas dores numa qualquer arte que me faça sentido, é que me consigo curar delas. E elas de mim. E ter conseguido abrir o computador, não obstante a luta interna, foi um passo que precisava de ser dado.
Dispenso mais do meu tempo a questionar-me se deveria, se teria importância, se dará em alguma coisa, do que propriamente a tentar. Julguei já me ter libertado dessa pessoa, mas há sempre algo em nós que nunca nos abandona, de todo. E faz parte do medo que assim o seja: se nos deixarmos ir, para lá dos limites que nos impõem inconscientemente, o que haverá, na verdade? Um campo minado? Uma seca total? Por outro lado, um jardim colorido, farto, de odores simbólicos? Só indo, para saber.
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