Tudo o que eu pudesse fazer para me esquivar da dor do sentir, era o que eu fazia. Nunca tinha compreendido todo o conceito de luto afetivo, pois, o luto sempre esteve relacionado com a perda de alguém que tivesse morrido… No entanto, se retirarmos da equação a componente efémera da nossa existência, deixarmos de nos dar com certas pessoas, seja por uma causa natural ou através de uma rutura mais drástica, não é perder alguém na mesma?
Nunca tinha compreendido o conceito de luto, de todo, até ter sofrido duas perdas de que não estava à espera – nunca estamos, na realidade! -. Aprendi que até nessa prática, cada um de nós prima pela sua individualidade. Por questões simbólicas, há quem se vista de preto por um período de tempo ou mesmo por uma vida inteira… Por outro lado, há quem não o faça, preenchendo de negro o seu coração e determinadas atitudes. O brilho no olhar entra em pausa, somos assomados por uma avalanche de questionamentos, colocamos tudo em causa…
De um modo até lírico, passamos a valorizar um pouco mais a vida que temos.
Então, quando soube transportar toda essa essência para o parâmetro de relacionamentos afetivos, houve uma porta que se abriu no meu coração e que não permitiu, apenas, a entrada de coisas boas. Mais importante ainda, aprendi a deixar sair. Não existe o desínmetro ideal para pesar a quantidade de lágrimas que me têm abandonado ultimamente. Se antes abominava esta prática, surpreendentemente é a elas às quais recorro, quando nada mais parece ajudar-me a equilibrar as camadas do meu íntimo.
Para além do choro, deixei de recear racionalizar e interligar todas as minhas tendências, de modo a compreender as suas naturezas e determinadas consequências. Pode custar imenso admitir ter tido uma certa responsabilidade em dadas ocasiões, contudo, é por trocar as vestes do papel de vítima para este mais maturo que, felizmente, vou dando por mim a mudar essas mesmas tendências e a receber, de peito aberto, novas experiências.
Lá por determinada coisa não ter resultado no passado, isso não significa que no momento presente não tenha de resultar.
Manter a esperança acesa, por muito cansativo em algumas ocasiões, é o que me tem permitido, igualmente, a nunca cessar neste desvendar de mistérios internos. Tal ajuda-me a compreender a conduta de outras pessoas e, por isso, fortalecer as nossas conexões. Bem dizem que as respostas vivem em nós, que só saberemos aceitar amor, respeito e toda uma panóplia de sentimentos bons quando o praticamos por nós mesmos… Tem-se tornado, assim, cada vez mais claro para mim apreender estas informações e, acima de tudo, compreendê-las.
Cabe a cada indivíduo, portanto, dar-se a conhecer aos seus atos, as devidas consequências e alterar o rumo das direções, se for o seu desejo ver a sua vida a mudar. Praticar o luto pelas minhas relações, fazer as pazes com esse luto, tem sido essencial para mim. Sobretudo por me permitir a perdoar-me pelas minhas ações e pensamentos, pelo que deixei pendente e que, noutros cenários, poderão ser vingados. Creio que estas palavras não ressoarão com toda a gente…
Há quem me poderá rotular de louca, alterna, o que for. Não partilho estágios de uma jornada semelhante com toda a gente e está tudo bem com isso.
A verdade é que ter-me disposto a este processo de autodescoberta física, mental, sentimental e espiritual encaminhou-me para respostas a questões que há muito tenho alimentado em mim… E a liberdade que se seguiu foi como nenhuma outra. Tudo passou a fazer sentido… Os horizontes expandiram-se, sem dúvida alguma. Dali, soube que, afinal, eu poderia trabalhar por uma solução e melhorar-me. Desde então, adivinha o que tenho feito? Exatamente, o luto por mim mesma.
Publicar este texto no último dia de 2020 não foi planeado. Todavia, encaixa na perfeição, pois acabará por simbolizar o fim de um ciclo que me transformou na pessoa na qual me tornei e que, de braços abertos, caminha para os lugares, pessoas e situações nas quais pertence estar. Pelos bons e pelos maus motivos, tudo serve de aprendizado. Pratico o luto por mim, porque carreguei imensas dúvidas ao longo da vida, muitas inseguranças, muita dor.
Dores que nunca soube como expressar, nem tão pouco se seriam válidas. Dores que se têm transformado em força para me superar.
Basta de ver muitas ondas passar sem fazer nenhum: daqui adiante pretendo trabalhar com elas e divertir-me pelo processo! Mergulhar ainda mais nas profundezas do meu ser, dar-me a conhecer a quem encaixar comigo e deixar-me encaixar com as pessoas que também me quererão nas suas vidas. Escondemos tanto potencial por receio de nos ignorarem, de sermos julgados, encolhendo-nos cada vez mais na penumbra das nossas dúvidas… E eu já não desejo que em mim sobreviva essa réstia de receio!
O luto, por muito que simbolize um momento de dor e perda, é também uma oportunidade de libertação, renovação, oportunidades… Aprendi imensa coisa ao longo destes 22 anos, mas quanto a esta questão, não há comparação! Farei dele o ritual de que for necessitando para me ir conhecendo… Mais importante, será um dos pilares mais cruciais para não me ir perdendo!
2 Comments
Marisa Filipa Ferreira Vitoriano
2 de Janeiro, 2021 at 19:47O luto é algo muito pessoal, mesmo parecendo uma dor comum. É algo que a que cada pessoa reage da sua maneira e não importam as “fases padronizadas”, importa que encontremos a nossa maneira de superar algo e nos sentirmos bem, sempre com aquela esperança acesa, de que falas.
Carolayne
3 de Janeiro, 2021 at 21:30Ora aí está! O mais importante é respeitarmos o processo de cada um!