DA SOLITUDE AO SENTIR, E VICE-VERSA

Conservo uma postura bastante severa, no que toca a sentimentos. Eu acho que, independentemente dos acontecimentos passados, nós devemos sempre revelar aquilo que sentimos, da maneira mais simples, relaxada e sincera possível. Sem reservas, nem tão pouco ressentimentos. Apesar de sempre haver a possibilidade de não nos corresponderem, sabem a quem é que fará mal acumular tamanha carga emocional, alimentando-a através dos recursos imaginários da mente? A nós. E sabem porquê? Porque, querendo ou não, os sentimentos têm vida própria e conseguem, em determinado momento, tomar as rédeas das nossas decisões por nós, impedindo-nos, ocasionalmente, de conseguir reagir, pensar e, muitas das vezes, de sentir em estado pleno.

Desabafarmos o que nos percorre os caminhos da alma não só nos livrará das tentativas de auto-mutilação espiritual, como nos libertará dos anseios que nos guiam numa escuridão imensa das expectativas que vamos construindo em nosso redor. O outro, o alvo do nosso esmero, tem o direito de saber, não para se apropriar de nós e nos converter, numa troca desesperada, no seu alvo, mas para que ele a partir daquela renovação no tempo, saiba como nos tratar e respeitar, com ainda mais afinco. Já perdi a conta das vezes em que o tenho dito, mas posso me considerar uma sortuda por nunca ter perdido as pessoas por quem, em algum momento, nutri um sentimento tão forte e mutável como o amor.

FOTOGRAFIA: @MILLESPHOTOS

Nunca me permiti ao capricho de guardar fosse o que fosse – embora sempre tivesse medo -, ciente de que nestas alturas, tudo para mim me deixa sensível, desorientada, fora do controlo e espectadora do meu núcleo central. Quando me apaixono, o meu cérebro troca as voltas, a minha capacidade de raciocínio embate contra os cantos do crânio e a minha percepção se modifica. Nunca cheguei a entender se para melhor ou pior, o facto, aquele que transporto comigo, é de que eu vou adquirindo novas nuances de personalidade, nunca negligenciando o ato de aprender com as lições da vida e, mais importante, ultimamente tenho tentado extrair o que há de positivo, em todas as impossibilidades de reciprocidade.

Roça a insensatez nos privarmos de tantas oportunidades na vida, somente por não sermos correspondidos. Automaticamente, e como se constituísse uma regra impossível de quebrar, fechamo-nos sobre nós mesmos, afirmamos que jamais nos conseguiremos permitir a novas aventuras, impedimo-nos de realizar tarefas, apenas porque as estamos a realizar sozinhos… Experimentar esse estado de estar, de solitude; aprender a observar-lhe as diversas idiossincrasias e as suas reações conforme as diferentes investidas da nossa necessidade em mudar e melhorar o que somos do nosso ponto de vista; sermos capazes de coabitar com o silêncio e torná-lo numa desculpa para meditar, respirar, organizar os diversos períodos de lucidez…

Todo este conjunto ao qual denominamos de auto-conhecimento estabelece a considerável vinculação do amor que deveria ser a base que nos sustenta e impulsiona a almejar mais, do lado de fora. Reconhecer esta tomada de posição para connosco mesmos, assumir o papel da pessoa que se cuida, se respeita, se transforma… Isso integra, de igual modo, em todo o processo de se estar comprometido em gostar de algo ou de alguém! Somos todos um poço de qualquer matéria e o engraçado da nossa evolução enquanto seres é a pré-disposição em comparticipar desse câmbio íntimo e que não tem maneira de secar. Por muito utópico, irreal, fantasioso, é sempre possível de extrair novos detalhes aos quais pertencemos, dando-os a conhecer a quem nos auxiliou nessa tarefa.

Apropriarmo-nos da solitude é, também, aceitar quando é que se trata do ensejo adequado para não termos de fazer tudo sozinhos.

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