Não existe. Nunca existiu. Mas por ene motivos que prefiro não numerar, também eu acreditei de que pudesse existir a possibilidade de conquistar esse patamar e por muitos anos eu fingi trabalhar para chegar lá. E utilizo o verbo “fingir” como modo de recordar de que não existem corpos perfeitos ou melhores do que outros, portanto, todo o nosso empenho equiparar-se-á com o óbvio: uma falsa ideia de sucesso e um falso caminho para percorrer.
Sofri bastante por conta dessa verdade que me tentavam vender, desde o marketing cujo resultado saltita de canal em canal, ou de feed em feed, como através das bocas do seio familiar e que, até hoje, ainda não entenderam que a sua opinião não me serve para nada. Para além de não serem fundamentadas, são frutos de estereótipos que há muito abandonei na berma da estrada e, honestamente, a melhor maneira de evitar um incêndio é não acender o fósforo sequer.
Houve noites em que chorei, noites em que me questionei porque razão me era tão complicado chegar lá, noites que cerravam as cortinas com uma única conclusão: se eu não tinha o corpo perfeito, eu jamais seria alvo de apreciação fosse de quem fosse. O meu cérebro estava formatado para perpetuar estes ideais envenenados e carregados de bolor e, como consequência, tudo o que eu fazia, dizia, pensava e projetava carregava em si um fedor imundo; um vírus que, de primeira mão, não apresentava modo de ser travado; uma mancha que me impedia de encarar o verdadeiro guia para as simplicidades da vida. A idade, como pregam por aí, traz consigo anexada uma certa maturidade e eu não fiquei imune a esse desenvolvimento.
Sem sombra de dúvidas que já tive as prioridades trocadas. Até me ter apercebido do contrário, treinar, para além de penoso, era uma atividade que me serviria como um meio para atingir a aprovação dos demais e, acima de tudo, um corpo decente… Mas acabei por descobrir que fazer o que quer que seja para agradar os demais…
1) nunca preencherá os requisitos e expectativas que tanto guardam de nós;
2) não é de todo saudável;
3) por muito que eu me esforce, o único corpo que eu terei será o meu, portanto, se for para o trabalhar, enriquecer e fortificar, que seja por uma questão de saúde mental e física, para além de servir, de igual modo, como uma demonstração de amor próprio e respeito pelo corpo que me foi dado.
Passei tanto tempo em frente do espelho que não sabia ao certo o que é que procurava ofender e mudar em mim. Muitas vezes, essa filtragem foi feita segundo a ideia terrível que me colocavam na cabeça de que o corpo ideal, aquele de proporções perfeitas e dimensões aceitáveis, eram todos os restantes que não o meu. Que a força dependia da magreza. Que a resistência dependia da magreza… Ao contrário do corpo perfeito, eu conquistei o amor-próprio, o meu reflexo no espelho, o maior e mais sincero dos sorrisos. A paciência de almejar algo que não existe converteu-se para outras crenças e teses, os meus anseios ganharam outros tons e, acima de tudo, a minha mente ficou tão límpida quanto o céu azul num dia de verão.
e foi aí que a mudança de paradigma, o amadurecimento da mente, levou-me a concluir de que MELHOR do que o meu corpo de hoje está o meu corpo de amanhã e para o qual eu trabalharei sempre, exatamente por saber que eu consigo mais e melhor pela minha saúde.
O que antes eram questões pré-formatadas, atualmente são sensações que vou adquirindo conforme aprendo como potencializar o meu corpo, os meus gestos, os percursos que ele poderá calcar, porque acima de um corpo que eu poderia usar para comparar com este ou com aquele, existe o meu e que me permite sentir os odores de um novo país, sentir a textura de uma nova planta na estante do quarto, observar o infinito do oceano, escutar o meu coração quando aumento as cargas dos meus treinos.
Não se trata de uma jornada tão linear; estou desde os doze anos, idade em que ganhei consciência do meu peso, a tentar e a falhar miseravelmente, na maior parte das vezes. A caminho dos vinte e dois, é que estou a conseguir descobrir o que é que realmente funciona com o meu corpo, é que estou a ganhar consciência do meu corpo…. Treinar já não é algo que me assuste – pelo contrário, ficar um dia sem o fazer deixa-me doida! -, a minha alimentação está cada vez melhor e o mais completa possível e os resultados, como quem aguarda pelo nascer do dia, têm-se deixado da timidez, aparecendo aqui e ali.
Acima de qualquer conceito de beleza e perfeição, existe a minha saúde física e mental, pois, isso é o que realmente importa nesta conversa toda.
6 Comments
Andreia Morais
25 de Abril, 2020 at 20:44Estou deste lado a fazer uma vénia a esta publicação! You go, girl ♥
Carolayne
25 de Abril, 2020 at 20:57*chorando* ahahah muito obrigada! *o* ♥
Mary
26 de Abril, 2020 at 11:34Que excelente publicação, a sério ❤
«(…) é que estou a conseguir descobrir o que é que realmente funciona com o meu corpo» tão isto! Perceber o que realmente funciona connosco, com o nosso corpo.
Aceitarmos e pararmos de ser tão críticos e tão duros connosco próprios.
Continua 🙂
Carolayne
26 de Abril, 2020 at 11:55Verdade! É toda uma jornada de desafios, mas que vale sempre a pena! ? Muito obrigada! ♥️
Joaninha
26 de Abril, 2020 at 15:07Que caminho bonito percorres todos os dias e que alegria é partilhá-lo contigo, meu Deus. Tu és inspiração em tudo o que fazes. Saber que finalmente vês o corpo como aquilo que é: um corpo, deixa-me extremamente feliz. ? tens um caminho de self-growth muito bonito pela frente. Estarei cá para isso.
Carolayne
27 de Abril, 2020 at 0:00Mokamba, Mokamba… Incrível como todas as tuas palavras me tocam de maneira diferente! ? Significam sempre tanto, muito obrigada! De coração! ???