Certezas universais, criatividade e sucesso

Os pensamentos estão a atropelar-se uns as outros. Já faz algum tempo que não entrava numa pausa da escrita, mesmo com coisas para dizer. Tenho estado mais focada no podcast, por isso, grande parte dos textos mudam de corpo transformando-se em voz. Até os dedos pesam no teclado, como se estranhassem estes movimentos que tentam acompanhar a velocidade das palavras que querem sair. Não só os pensamentos se atropelam como os dedos nesta dança. Eles já foram mais leves, seguros e silenciosos neste terreno.

fotografia da minha autoria. não usar sem consentimento prévio

Creio que a readaptação tenha destas coisas. Por muito que conheçamos parte do ambiente a que vamos, há sempre algo que estranhamos.

Neste caso, falar com o coração. Ou escrever. Sinto-me uma criança que redescobre uma caixa há muito guardada debaixo da cama, esquecida por motivação da preguiça de arrumar, espreitar, recuperar as horas perdidas perdendo-as ainda mais. Encaro o ecrã com curiosidade, remonto de modo flash por diversos cenários em que, com temperaturas como a de hoje, o fumegar do chá no canto do olho e a vela que, por acaso, ainda não acendi, partilhei desejos, preocupações e aspirações dignas de uma adaptação cinematográfica.

Julgo que por viver cada vez menos dependente das ilusões é que se tem tornado complicado imaginar para, depois, criar. Crescer movida por paixões confusas, carentes, resultou num emaranhado de rotinas criativas que, hoje, não me motivam a nada. De momento, estou a passar por uma fase de reconstrução da minha criatividade. Tenho pesquisado com calma, paciência e compaixão o que me motiva realmente a criar.

Antes, fazia-o para fugir do mundo real, para não ter de lidar com questões da adolescência, corações partidos, amizades pouco seguras.

Depois, movida pela necessidade de me encaixar em qualquer que fosse o grupo mais apelativo para as minhas carências, li muito sobre como ser criativa. Li, ouvi, vi, sempre na esperança de finalmente sentir a lâmpada a ligar-se sobre a minha cabeça. Os meus momentos eureka acontecem quando não os forço. Quando não penso demasiado no pensar, de todas as vezes em que simplesmente faço o que tem de ser feito.

As últimas semanas têm sido usadas para otimizar o meu tempo. Não fazia ideia de que escolher o caminho que realmente encaixa com os meus sonhos mais profundos me possibilitasse de ter mais tempo. Muito por dedicá-lo às mil e uma estratégias que tento criar para contornar situações que me são tóxicas. Confesso que ainda não sou tão assertiva como gostaria, embora esteja a caminhar para lá. Abraçar a responsabilidade pela minha vida e, mais importante, relembrar-me de que aqui a uns anitos já cá não estarei para reverter certas decisões, deixa-me em paz.

Sei que muitos fogem desta certeza universal, sobretudo pelas ansiedades que mal reconhecem como tal.

Para mim, no entanto, é de suma importância ter a morte em conta. Porque eu não me quero tornar numa pessoa amargurada, que não quebrou a voz do medo, que se deixou levar pelos guiões dos demais. Essa perspetiva assusta-me mais do que saber que vou morrer. E, sendo enterrada, que seja de sorriso congelado pelo espírito que cumpriu a sua missão de ser verdadeiramente feliz. Eu sei, de repente, esta reflexão tornou-se bastante mórbida.

O que quero dizer, portanto, é que a minha criatividade chega até onde eu a permitir. Talvez o mesmo se suceda com qualquer outro ser humano, afinal, somos nós que nos inibimos de ser, a partir de um certo momento das nossas vidas. Diria, até, que tudo começa quando nos obrigam a escolher, em tenra idade, que caminhos seguir, que vida ter… Sendo que a vida é pura imprevisibilidade! Como não nos alertam deste fator?

Tendo em conta o rumo que a minha vida tem tomado, acho muito perigoso condicionarem a nossa liberdade numa caixa de hipóteses irregulares, que não encaixam com a nossa essência… Isto que nos permitirem descobrir o mínimo dos seus contornos. Parece que não está relacionado, mas ainda não gravei o episódio desta semana. O tema é resultado de uma saída com amigas, em que discutimos abertamente como nos sentimos em relação ao amor, expectativas e planos.

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Mais ainda, como tem sido chocante para cada uma de nós nos depararmos com a complexidade do termo “sucesso”.

Estará mesmo relacionado com dinheiro? Com a escrita, defesa e livramento de uma tese? Viver fora e recomeçar? Trabalhar em algo que não nos apraz para fazermos um pé de meia e, agora sim, focarmo-nos no que amamos? Quantos anos levamos nisto? Quantos ataques de pânico e ansiedade, idas ao hospital devido ao stress, problemas de saúde até, e se formos a tempo, de darmos corpo aos nossos sonhos? Quero muito falar disto no podcast.

Além da falta de oportunidade, as minhas ideias ainda não estão bem arrumadas. Não que as vá esperar eternamente, contudo, este pequeno desabafo é já um bom ponto de partida. A minha criatividade é mesmo assim, começa como um ponto e termina como ela bem entender. Afinal, é ela quem manda porque de todas as vezes em que a tento controlar, ela esmorece. E, como não quero nada disso para mim, cedo-lhe o palco por inteiro. Só assim conseguimos conviver harmoniosamente.

O que pensas sobre o assunto? Gostaria de ler a tua opinião! ♥

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