Desta vez, decidi arriscar numa nova forma de realizar reviews de livros, talvez algo mais completo. Estando numa onda de experiências, ainda não sei se esta será a fórmula final, ou pelo menos, a que adotarei daqui para a frente para algumas obras. Tudo dependerá do vosso feedback. Da lista de livros que queria ler ainda este ano, esta foi uma das leituras completadas. Demorei o meu tempo, mas sempre com a vontade de absorver as informações e sensações que esta leitura soube proporcionar-me. Não direi que é um livro difícil, pois estaria a mentir. Uma das coisas que me prendeu foi exatamente a linguagem simples e poética, que nos envolve e cativa a cada parágrafo. É um misto de descrições e falas, sempre com mensagens que valem a pena a reflexão.
Publicado em 1954, “O Deus das Moscas” já teve direito a duas adaptações cinematográficas, uma em 1963 e outra em 1990. Para quem desconhece, o seu título é uma referência a Belzebu, uma divindade das mitologias dos filisteus e de Canaã, com várias referências na Bíblia como sendo o próprio diabo. A obra em si, retrata o “”desenvolvimento”” de um grupo de crianças, para o seu estado selvagem, a partir do dia em que o avião que as afastava da guerra, despenha numa ilha deserta. Longe da supervisão adulta, este grupo tenta organizar-se da melhor maneira possível, mal sabendo eles que aquilo que eram no meio da sociedade inglesa, estava prestes a desmoronar-se.
Atualmente, e mesmo das poucas distopias que li de antigamente, o grupo atingido pelas regras da sociedade, esfomeados pela mudança, são sempre os adultos. Se entram crianças, mal têm direito a cinco minutos de fama, passando despercebidas naquele enredo… Porém, aqui não é assim. A cada dia que passa, a inocência de que são conotadas é devorada por um instinto de sobrevivência e selvajaria aterrorizantes. Sem adultos e quem os comande, planta-se ali um campo de forças, sendo que os mais fortes prevalecem.
Quando despenham, são domados pelo medo e receio de falharem e de não conseguirem escapar da ilha com vida. Contudo, lá conseguem organizar-se. O que eu mais gostei neste livro foi exatamente o facto de pequenas crianças, mas é que mesmo muito jovens, se terem revelado a cada capítulo. Quando dava por mim, sentia que tinha à frente uma narração de um grupo de adultos, e quando voltava à realidade, apercebia-me de que não, eu estava a ler páginas carregadas da vivência de crianças, indivíduos capazes de crimes, que a dado momento nos fazem questionar se são cometidos de forma consciente ou inconsciente.
“O Deus das Moscas” é uma obra repleta de filosofias e significados que, em conjunto, nos obrigam a meditar seriamente acerca de nós e das pessoas que nos rodeiam. Sendo nós um produto da natureza, valerá mesmo a pena a sociedade atirar-nos com mil e uma moralidades, regras, formas de ser e de estar, quando sem nos apercebermos, e numa situação vulnerável, somos expostos frente a frente com o nosso estado selvagem? Será mesmo que a educação que nos dão, assim como os valores que nos passam, é a resposta ideal para nos conseguirmos organizar dentro de um grupo onde residem a discórdia, a ânsia do poder, a tentação?
Estas e muitas outras questões pairam na nossa mente, famintas por uma resposta que as satisfaçam. A cada página, sobem-nos à cabeça factos que poderão, eventualmente, tornar-se físicos e palpáveis. A cada página, assistimos ao desenvolvimento das personagens, a regressão de algumas, aos mais bizarros acontecimentos e ao mistério que poderá ser a salvação destes seres. É um livro que aconselho bastante, principalmente, devido ao enriquecimento do nosso próprio ser. É um abre olhos, um abanão, um choque que nos fará desejar melhorar a pessoa que somos.
2 Comments
Joana Sousa
15 de Setembro, 2016 at 11:26Este é daqueles livros que quero muito ler mas do qual nunca me lembro quando vou caçar livros! Há uns anos a in skené levou a cena o Azul Longe nas Colinas, que, numa situação menos extrema, põe as mesmas perguntas em cima da mesa: perante a possibilidade de não ter regras, será que as crianças – e nós, adultos, consequentemente – somos assim tão inocentes? Será que alguém é genuinamente inocente e bom ou os nossos instintos são mais distorcidos do que aquilo que queremos admitir? ?Jiji
LIVROS FAVORITOS DE CADA GÉNERO (*) | imperium blog
30 de Julho, 2020 at 17:23[…] tanto dividida quanto ao título que poria aqui. Cheguei a uma conclusão justa, escolhendo “O DEUS DAS MOSCAS“, de William Golding, como um dos meus clássicos favoritos. Recorrendo ao arquivo do blogue, […]