Sei pouco da família Addams. E, desse pouco, sei que são uma família peculiar, pouco dada aos costumes usuais da sociedade, cumprindo uma cultura que eles mesmos criam diariamente. Decidi ver Wednesday por conta de uma publicação no Instagram. Não perdi tempo. Em dois dias, fiquei a conhecer Wednesday, a filha mais velha do casal Addams e que tem visões.
É por causa de uma dessas ocorrências que ela é recambiada para uma escola para seres especiais, numa tentativa de a enquadrarem entre pessoas.
Só que ela é pouco dada a essa espécie, exeto quando não é ela a fazer partidas contra o irmão. Ou quando tem um grande mistério para resolver… Mistério esse que envolve uma das suas ancestrais da época em que a bruxaria era resolvida na fogueira. Embora o plot se assemelhe a tantos outros, a verdade é que me surpreendi pela positiva.
Não esperava enquadrar-me tão bem numa história já muito antiga, com receio de não entender certas referências. Como ainda não me aprofundei nos detalhes desta família, óbvio que houve muita coisa que tive de completar com a imaginação.
Contudo, senti-me entretida, um pouco incomodada com a rapidez de certas interações, empolgada para ver os bonzinhos a darem-se bem. Achei deslumbrante como é que cada personagem reflete bem as origens da sua desorientação, inadequação, questões existenciais ou mesmo de desenvolvimento humano. Bom, neste caso, de desenvolvimento dos seus poderes de acordo com a sua espécie.
Foi fixe observar o modo como todas estas personagens penetraram a bolha quase impenetrável da Wednesday. Ela que dispensa qualquer contacto com a sociedade, além de livros, música ou partidas maldosas.
Cheguei até a identificar -me com os seus porquês, aceitando como é que ela decidiu contornar as expectativas criadas em seu redor. Apesar de se tratar de uma série em que o confronto é entre humanos e párias, não é curioso identificar estas mesmas guerras no mundo real?
Não é curioso como é que nunca fomos totalmente capazes de aceitar as diferenças culturais, colocando a nossa num patamar inalcançável? Sendo que a cultura é algo que se transforma e se adequa a cada pessoa, conjunto de pessoas, momentos históricos? Ainda não há um consenso que nos permita conviver sem amarrar o punhado da faca, sem deixar o rasto de gasolina caso seja necessário, ou mesmo um prego na cadeira de quem não aceitamos tão bem.
A Wednesday personifica características que faltam a muitos: ser confiante o bastante para não se importar com a opinião alheia, permitindo-lhe fazer o que a impulsiona. Por outro lado, carecia também da humildade para aceitar que, como seres sociais – afinal foi isso o que nos permitiu sobreviver – não há mal algum em sermos vulneráveis com as pessoas certas.
Logo, se soubermos escolher com quem partilhar e sermos partilhados, numa onda de amor e concordância em discordar, maior a facilidade de reestruturarmos não só a nossa indole como a sociedade num todo.
Estas reflexões parecem bué fora da caixa, só que por detrás de séries, filmes ou livros que aparentam não ensinar nada, há pequenos espelhos do mundo real. Basta que os saibamos identificar. Em suma, o hype vale totalmente a pena, sobretudo para aqueles que, como eu, não estão a par de clássicos que, sem dúvida, merecem a nossa apreciação!
No Comments